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Mensagens

A mostrar mensagens de novembro, 2016

A "panne"

Era tarde. Os candeeiros altos com luzes amarelas iluminavam a rua. De tempos a tempos, um carro aparecia devagar. Rodava a uns 30 km/h para parar e fazer inversão de marcha. Ela esperava dentro de um Volkswagen amarelo. Estava sentada ao volante com a cabeça encostada à cabeceira do banco. Quase não se movia, apenas oscilando o olhar entre um novo carro que se aproximava e o vazio. Olhava o carro e voltava a encostar-se como se a espera não pudesse ser interrompida. Nem o movimento junto ao Honda cinzento lhe quebrou a serenidade. Conferia os automóveis que chegavam e marcavam o prolongamento da sua espera. Nada havia que a inquietasse. Trazia a tranquilidade aos ombros que a prendia ao banco e a mantinha impávida. As pessoas do Honda falavam alto e gesticulavam. O carro tinha empanado e não conseguiam fazê-lo voltar a mover-se. Eram três. Dois homens e uma mulher. Ela, no lugar do condutor, rodava a chave e carregava no acelerador, enquanto eles, decididos e enérgicos, empurrav

Matar o tempo

Estou à espera de consulta. Entram e saem pessoas dos gabinetes: doentes, médicos, assistentes. Há quem fale ao telefone; quem passeie os dedos no ecrã do telemóvel; quem veja televisão; quem leia revistas. Pego no meu caderninho e escrevo. Observo as pessoas e desenho-as no papel. Uma força intrínseca obriga-me a transcrever momentos, como se uma fome insaciável me impelisse a sugar a alma dos outros que só cessa em forma de palavras. Preciso perpectuá-las por escrito para que não me fujam da memória. - Sr. Diogo Sousa! - chama a assistente do gabinete quatro. O Diogo, de uns 15 anos acabados de fazer, lá segue para o gabinete quarto de phones nos ouvidos e telemóvel na mão. A mãe acompanha-o com ar preocupado, o mesmo ar preocupado que todas as mães têm quando vão ao médico com os filhos. - Nº 47! E a senhora da senha 47 dirige-se ao balcão. Cruzam-se conversas em burburinho. O casal que está ao meu lado fala de trivialidades. Matam o tempo, aqueles dois. A recepcionist

Os TPC e os pais

Esta semana, a notícia de uns pais espanhóis que iniciaram uma greve aos TPC  gerou mais discussão em volta dos trabalhos de casa. Vou voltar a este assunto, de que já falei aqui várias vezes, e volto, porque me revolve o estômago deparar-me com lutas destas, ao contrário e egoístas. Os pais espanhóis revoltaram-se contra os TPC de fim-de-semana, porque, segundo os mesmos,  "invadem o tempo das famílias" e "violam o direito ao recreio, à brincadeira e a participar nas actividades artísticas e culturais".  Ora, se os miúdos têm algum tempo para fazer trabalhos de casa, esse tempo será aos fins-de-semana, certo? E quanto aos TPC durante semana, não há revolta? Ah, ok, os dias de semana não dão para irem passear e fazer outras actividades com as famílias, mas dão para os miúdos irem ao futebol, à música, à ginástica ou ao inglês e estas actividades não lhes roubam tempo nenhum para o recreio ou para as brincadeiras, pois não? Ah e tal, são artísticas e culturais e